O menino que era esquerdo viu no meio do quintal um pente.
O pente estava próximo de não ser mais um pente. Estaria mais perto
de ser uma folha dentada. Dentada um tanto que já se havia incluído
no chão que nem uma pedra um caramujo um sapo. Era alguma coisa
nova o pente. O chão teria comido logo um pouco de seus dentes.
Camadas de areia e formigas roeram seu organismo. Se é que um pente
tem organismo.
O fato é que o pente estava sem costela. Não se poderia mais dizer se
aquela coisa fora um pente ou um leque. As cores a chifre de que fora
feito o pente deram lugar a um esverdeado a musgo. Acho que os bichos
do lugar mijavam muito naquele desobjeto. O fato é que o pente
perdera a sua personalidade. Estava encostada às raízes de uma árvore e
não servia mais nem para pentear macaco. O menino que era esquerdo
e tinha cacoete pra poeta, justamente ele enxergava o pente naquele
estado terminal. E o menino deu para imaginar que o pente, naquele
estado, já estaria incorporado à natureza como um rio, um osso, um
lagarto. Eu acho que as árvores colaboravam na solidão daquele pente.
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